quinta-feira, 4 de abril de 2013

PÁSCOA, REALIDADE E ESPERANÇA

Temos até dezenove de maio, o tempo litúrgico para a celebração da ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Há uma necessidade antropológica de prolongar temporalmente a oportunidade para contemplar o que não pode ser experimentado pela pessoa humana em um só instante. Na liturgia, o tempo pascal é uma resposta pedagógica a uma necessidade com duas faces, a grandiosidade do mistério pascal de Nosso Senhor Jesus Cristo e o limite humano na compreensão.
  
O testemunho dos apóstolos, discípulos e algumas mulheres é contundente e concorde: vimos o Senhor ressuscitado! É o que experimentaram e transmitiram a nós, o que encontramos registrado no Novo Testamento, na segunda parte da Bíblia Sagrada. Colocamos fé e confiança neste testemunho, conservado pela Igreja, Povo de Deus, através dos séculos. A fé dos apóstolos e discípulos é a nossa fé. É esta mesma fé que transmitimos às novas gerações de batizados: o Senhor morreu e ressuscitou para a nossa salvação!

Para Nosso Senhor Jesus Cristo, a ressurreição é uma realidade, um fato: ressurgiu dos mortos, está vivo, com um corpo glorificado. Pode ser visto e tocado por aqueles a quem se manifestou na sua nova condição, caminhou, comeu, conversou, interagiu com eles. Porém, ele não era reconhecido de imediato, o que mostra que o seu corpo encontrava-se em uma nova situação, um corpo transfigurado, não mais sujeito aos limites da materialidade. O pressuposto para o reconhecimento é a fé, quem não acredita não o experimenta ressuscitado.

Para nós Católicos Apostólicos Romanos, membros do Corpo Místico de Cristo, a ressurreição é uma esperança: como Ele ressuscitou, também ressuscitaremos. O que aconteceu com Ele, ocorrerá conosco, esta é uma promessa feita por Ele mesmo quando viveu entre nós. N’Ele vemos e pressentimos o que nos aguarda no futuro, o nosso “destino”, sermos glorificados na carne, como rezamos na Profissão de Fé.

De algum modo já participamos da condição de ressuscitado de Nosso Senhor Jesus Cristo, pois na Igreja, seu Corpo Místico, Ele é a cabeça e nós os membros. A vida nova de ressuscitado está presente em todo o corpo. A nossa participação neste mistério de sua morte e ressurreição ocorre através do batismo: batizados, morremos e ressuscitamos com Ele. Deste modo, ressuscitar com Cristo não é uma esperança só para o futuro, mas uma esperança já presente e real em nossa condição de filhos e filhas de Deus, membros da Igreja, seu Corpo Místico, Povo de Deus no mundo e na história.

Somos peregrinos e estrangeiros aqui e agora, ao mesmo tempo. Somos cidadãos do céu, mas vivemos na terra. Esta condição torna dramática nossa vida cristã. Vivemos na fé em Nosso Senhor Jesus Cristo, esperando participar integralmente da sua condição de ressuscitado. Enquanto aguardamos, vivemos no amor, fazemos da caridade o nosso diferencial indicativo de quem somos e do que aguardamos.

Corremos o risco de não compreender adequadamente a nossa condição de renovados em Cristo e isso encontra reflexo também na liturgia. Alguns acham que vivemos só a noite escura da morte e do sofrimento. Outros, que já vivemos a plenitude da ressurreição. Sim e não, ambas tem algo de verdadeiro, mas se complementam e se iluminam reciprocamente. O equilíbrio e a saudabilidade da vida dos católicos apostólicos romanos depende da capacidade de compreender e viver como participante do mistério da morte e ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, plenamente realidade para Ele, ainda esperança para nós, mas esperança real, testificada sacramentalmente.

Na ação pastoral, o acento exclusivo na morte ou na ressurreição ilude os fiéis e deturpa a liturgia. Ilude porque não apresenta a verdade como crê e ensina a Igreja da qual somos parte. Deturpa a liturgia pois dá a ela uma natureza que ela mesma não possui enquanto liturgia da Igreja Militante, chancelada pelo Colégio dos Bispos. Não fujamos da dimensão dramática da vida cristã, esse é o melhor caminho para nós e para os que se encontram confiados aos nossos cuidados.

A Páscoa é uma realidade e uma esperança, para a vida e a liturgia. Vivamos assim.

+ Tomé Ferreira da Silva
Bispo Diocesano de São José do Rio Preto, SP

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